O Património Religioso – Do Material ao Imaterial

O Património Religioso – Do Material ao Imaterial

Existe um património imaterial associado às práticas religiosas das comunidades que ainda falta conhecer e divulgar. Se nos últimos anos o património imaterial tem ganho algum destaque na academia, ainda há um longo caminho a percorrer no sentido de proteger e divulgar as suas manifestações.

06 jan 2023
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O fenómeno religioso é uma presença constante no desenvolvimento de todas as civilizações. O sagrado, enquanto manifestação do transcendente, interdito e intocável, é representado das mais diversas formas, acabando por se constituir como a base do que hoje designamos património cultural religioso. Neste conjunto observamos o património construído – desde as basílicas até às mais simples capelas –, o património artístico que se consubstancia nas  diferentes peças de património móvel – pinturas, esculturas, alfaias religiosas ou as vestes sacerdotais -, o património documental com os seus arquivos e cartórios e, por fim, as muitas manifestações do património imaterial com as suas interpretações, devoções e ritos.

Este é um conjunto complexo a que se somam algumas características muito próprias. Em primeiro lugar a sua titularidade pertence, na sua maioria, a uma entidade privada o que coloca sempre uma tensão adicional na relação com as instituições estatais que têm uma lógica enquadrada no laicismo de Estado.

Esta última questão cruza-se com o facto de este ser um património em uso e, portanto, sujeito a uma utilização quotidiana. Por fim importa destacar a crescente laicização das sociedades e a alteração das práticas religiosas que criou uma distância entre o público e este património, seja na sua compreensão, seja na sua função ritual. Por tudo isto o trabalho de mediação cultural, de divulgação e promoção do património religioso assume hoje uma importância decisiva, até para a sua preservação, conservação e interpretação. 

Oeiras, enquanto espaço de uma comunidade, tem uma história rica e diversificada no que diz respeito a práticas religiosas. Desde os vestígios de rituais mágicos ligados ao povoado de Leceia até à construção contemporânea de templos, são muitos séculos em que este território acumulou marcas destas práticas. 

De forma mais evidente podemos admirar as muitas igrejas católicas. Mas mesmo entre estas existem alguns exemplos particulares como São Pedro de Barcarena, São Romão de Carnaxide, Nossa Senhora de Porto Salvo ou a Igreja Matriz de Oeiras. Por outro lado, existem ainda as manifestações do religioso em património móvel e integrado.

A azulejaria é um dos mais ricos e facilmente identificado, mas existem exemplos muito interessantes entre as alfaias de culto, as pinturas, mobiliário, esculturas e até alguma talha. Oeiras tem ainda exemplos de diversos espaços de culto que foram alvo de processos de dessacralização, caso das capelas do Palácio Marquês de Pombal e do Palácio da Quinta da Terrugem ou Flor da Murta. Ainda menos comum é um espaço sob gestão municipal com culto ativo, neste caso a Igreja do Mosteiro da Cartuxa.



No património documental não podemos deixar de destacar o que já se conhece sobre a paróquia de Oeiras inscrito no Inventário do Arquivo Histórico da Paróquia de Nossa Senhora da Purificação de Oeiras da autoria de Maria da Conceição Cyrne de Castro. Sabe-se que outras paróquias e outras igrejas têm os seus registos e os seus fundos documentais em reserva. Também aqui importa balancear os interesses da conservação e utilização com a divulgação e acesso.

Por fim importa realçar que existe um património imaterial associado às práticas religiosas das comunidades que ainda falta conhecer e divulgar. Se nos últimos anos o património imaterial tem ganho algum destaque na academia, ainda há um longo caminho a percorrer no sentido de proteger e divulgar as suas manifestações. Neste âmbito o Concelho de Oeiras tem no seu seio uma manifestação de grande relevância, o Círio Saloio ou culto a Nossa Senhora do Cabo Espichel ou Santa Maria da Pedra de Mua, que nos faz recuar até ao séc. XIV.



As tarefas de articular todas as questões levantadas anteriormente, desde os interesses particulares às políticas públicas de proteção e divulgação do património, desde o respeito pelo culto e o sagrado até à fruição da sua venustidade ou a simples inventariação e proteção, compete a todos enquanto comunidade. 

O papel da Igreja Católica não pode ser desprezado, mas também não pode a mesma ser deixada sozinha sem o contributo de todos os restantes atores sociais. É precisamente porque o património cultural tem uma profunda dimensão social e cultural que iniciámos este texto com uma citação da Conferência Episcopal Portuguesa sobre a importância da sua fruição pública. 

Por tudo isto, durante o presente ano, este espaço fará parte do esforço de todos para se conhecer e valorizar o património religioso de Oeiras. Naturalmente que pela dimensão e objetivos desta rúbrica será um contributo focado na divulgação. Não temos a pretensão de revelar segredos ou investigar em profundidade, mas não deixaremos de promover, divulgar e valorizar este património.

Deixamos, também, o repto a que outros nos sigam!